Com as alterações advindas e bem-vindas da implantação do IFRS na contabilidade societária brasileira tivemos profundas e importantíssimas mudanças no sistema de reconhecimento e mensuração dos itens básicos de qualquer empresa nacional – receita, custo e despesa – todavia, também trouxe muitas duvidas por parte dos contadores e assessorias especializadas de como interpretar tais normas internacionais e de como nacionaliza-las.
Entretanto, tais normas tendentes a nos adequar a contabilidade praticada internacionalmente, com o objetivo de qualquer investidor nacional ou internacional possa compreender os nossos demonstrativos contábeis, calcular o desempenho da empresa e decidir se irá ou não investir no nosso querido e grandioso Brasil, por alterarem substancialmente a contabilidade de outrora praticada, muitos profissionais da área administrativa, jurídico-tributária e, até mesmo, contadores, encontram-se em duvida sobre como interpretar e como encarar essas novas formas de reconhecimento e mensuração de receitas e, vendo a necessidade de todos nós na discussão e aprofundamento de tais questão, é que nós trataremos de, mensalmente, postar aqui de uma forma simples, didática e objetiva as interpretações sobre como reconhecer e mensurar receitas, custo e despesa, a fim de alcançarmos o melhor entendimento dos pronunciamentos do IFRS e de, juntos, alcançarmos a maestria na contabilidade societária, procurando uma boa performance financeira e fiscal para a empresa.
Iniciaremos, com este post, a tratar do reconhecimento de receitas de vendas e prestação de serviços.
O que é receita?
Aumento no benefício econômico durante o período contábil sob a forma de entrada de recursos ou aumento de ativos ou diminuição de passivos que resultam em aumentos do patrimônio liquido da entidade e que não sejam provenientes de aporte de recursos dos proprietários da empresa.
A receita inclui, aqui, só as entradas bruta de benefícios econômicos recebidos e a receber pela empresa quando originários de sua própria atividade, ou seja, somente os benefícios econômicos que fluam para ela, resultantes em aumento do patrimônio liquido.
Conforme veremos abaixo, a receita deve ser reconhecida quando for provável que os benefícios econômicos futuros fluam para a entidade e esses benefícios possam ser mensurados de forma confiável.
O que são bens para o pronunciamento CPC 30?
Bens, para o CPC 30, são aqueles produzidos pela entidade com a finalidade de venda e bens comprados para a revenda, tais como mercadorias compradas para venda no atacado e no varejo, terrenos e outras propriedades mantidas para a revenda.
O que entende por prestação de serviços para o CPC 30?
Atividade da empresa estabelecida contratualmente a ser executada por um determinado lapso temporal, não se enquadrando, aqui, os contratos de construção que estarão em outro CPC analisado posteriormente.
Como mensurar a receita?
O montante da receita é aquele valor fixado contratualmente entre as partes e deve ser mensurado pelo seu valor justo da contraprestação devida recebida ou a receber, deduzindo-se os descontos comerciais e/ou bonificações concedidos.
Exemplo: digamos que a empresa ABC coloque á venda um carro no valor de R$ 10.000,00 e a pessoa DEF, interessada, procura a empresa e realiza a compra com um trade discount (desconto comercial) de 10%, então, segundo o CPC, o valor a ser reconhecido R$10.000,00 – (10%*10.000,00), ou seja, R$90.000,00.
Todavia, digamos que a receita proveniente das vendas venha a ser diferida. Neste caso, o valor justo da contraprestação pode vir a ser menor do que o valor nominal do caixa recebido ou a receber. Isso por que, nesse caso, há uma diferença entre a taxa de juros cobrada e a que deve ser imputada para a determinação da receita pois, quando o contrato constitui um tipo de transação de financiamento, o valor justo da operação deve ser determinado por meio do desconto de todos os futuros recebimentos previstos (diferimento), tomando por base a taxa de juros imputada de um instrumento financeiro similar ou a taxa de juros para o pagamento a vista.
Exemplo: Digamos que a empresa ABC do exemplo anterior vendeu o mesmo carro no valor de R$ 10.000,00 para o cliente DEF para pagamento em 5 parcelas de R$2.000,00 com vencimento a cada 30 dias, nos teríamos a seguinte situação:
Nominalmente a empresa ABC receberia R$2.000,00 por mês, efetuando a venda a valor nominal a R$ 10.000,00.
Para a contabilização na sistemática no CPC 30, a empresa ABC, deverá efetuar o desconto – ou utilizando uma taxa de juros de desconto no valor de instrumento financeiro similar ou utilizando a taxa para pagamento a vista que, no presente caso, seria de 10% - para cada período de recebimento futuro, ou seja, cada mês durante os 5 meses.
Intuitivamente chegaremos a conclusão de que haverá uma diferença entre o valor justo – efetuado o desconto em cada mês de pagamento da taxa de juros de instrumento similar ou a taxa de juros para pagamento a vista – e o valor nominal recebido. Essa diferença entre o valor justo e o nominal será reconhecido como receita de juros, o qual veremos quando estudarmos o CPC 38, que trata do reconhecimento e mensuração de tais instrumentos.
Quando reconhecer a receita de venda de bens?
A receita deve ser reconhecida quando satisfeita as seguintes condições (todas elas):
- Transferência para o comprador dos riscos e benefícios inerentes á propriedade dos bens.
Aqui devemos pensar naquela modalidade de entrega de mercadorias internacionais chamadas CIF (Cost, Insurance and Fright) e FOB (Free on Board). O frete na modalidade CIF acontece quando o toda a logística do frete é paga pelo fornecedor e, aqui, o reconhecimento da receita se dará no momento da entrega da mercadoria para o comprador. Na modalidade FOB o toda a logística do frete é do comprador, pois o vendedor, no momento da entrega da mercadoria do courier, se desobriga perante o cliente e, nesse momento, deve reconhecer a receita do produto da venda, satisfeito, claro os demais requisitos.
- A entidade – empresa vendedora ou prestadora de serviço – não mantenha envolvimento continuado na gestão dos bens vendidos em grau que a associe a propriedade e controle dos bens.
Nesta situação podemos enquadrar as tais vendas em consignação, onde o “comprador” fica com a guarda dos bens e vai reconhecendo a compra no momento da saída de tais bens de seu estabelecimento. Lembre da mercearia do senhor chinês do pastel vizinho a casa que você morava quando era criança... a pitchula, coca-cola, guaraná antártica e etc eram todos em consignação das empresas fabricantes de refrigerante pois ficavam sob o deposito do chinês e esse pagava a empresa pelo que vendia.
- Valor da receita possa ser mensurado com confiabilidade.
Aqui não necessita tecermos considerações a respeito, posto que decorre, até mesmo, de um principio contábil, do registro dos dados com confiabilidade.
- Probabilidade de os benefícios econômicos associados a transação fluirão para a entidade.
Venda se tornará em caixa. Aqui merece destaque uma discussão acerca do motivo de venda de bens se o vendedor tinha duvidas quase certas de que o comprador seria insolvente. Como poderia vender nessas circunstancias? Esse é o tipo de caso que somente acontecerá quando a compra e venda se tornar tao duvidosa que o seu registro impertinente.
- Despesas incorridas ou a serem incorridas referente á transação possam ser mensuradas com confiabilidade.
Mesma coisa já falado no item 3, aqui não necessita tecermos considerações a respeito, posto que decorre, até mesmo, de um principio contábil, do registro dos dados com confiabilidade.
Pois bem, importante frisarmos que a receita não deve ser reconhecida quando existe apenas a intenção de adquirir ou produzir as mercadorias a tempo para a entrega. Vendas faturadas e não entregues devem ser reconhecidas quando seja provável que a entrega será faturada, o item esteja no estoque do vendedor identificado e pronto para entrega, o comprador deu instruções especificas quando será a entrega e as condições de pagamento sejam as usualmente praticadas no mercado.
Situação importantíssima de ser abordada é quanto a venda a prazo para recebimento em prestações, onde a receita a ser atribuível ao preço da venda é a líquida de juros, devendo ser reconhecida na data da venda, onde o preço da venda, conforme já exposto, é o valor presente da contraprestação descontando-se das parcelas a receber a taxa de juros imputada e os juros de tais parcelas serão reconhecidos como receita á medida em que serão gerados.
Por ultimo, importante consignarmos que pelo próprio principio da confrontação das despesas com as receitas existe o item 5 para o reconhecimento deste ultimo, posto que a receita e a despesa relacionada a uma mesma transação ou a outro evento devem ser reconhecidas simultaneamente e – importante! – quando a despesa não puder ser mensurada com confiabilidade a receita não devera ser reconhecida e se qualquer prestação de receita tiver sido reconhecida pois recebida pela venda de bens, deverá ser reconhecida como passivo.
Quando reconhecer a receita de prestação de serviços?
A receita da prestação de serviços, de acordo com o CPC 30, deverá ser reconhecida de acordo com o percentual de obra concluída (stage of completion), quando puder ser estima de forma confiável, é claro.
Todavia, a ocorrência da transação – prestação do serviço – somente poderá ser estimado com confiabilidade quando ocorrer as seguintes situações:
- Valor da receita puder ser mensurado com confiabilidade, ou seja, a cada etapa de conclusão da obra eu puder saber com liquidez quanto de receita poderei reconhecer;
- For provável que os benefícios da prestação do serviço acontecerão;
- Cada estagio de conclusão da obra puder ser medido com confiabilidade. Aqui importante consignar que caso haja necessidade de revisão da receita a medida que sejam os serviços executados, desde que medidos com confiabilidade, estes poderão ser feitos, desde que a empresa tenha um sistema orçamentário e de relatórios financeiros eficaz capaz de demonstrar com clareza tal alteração necessária.
- As despesas incorridas e as despesas a ocorrer puderem ser medidas com confiança.
Importante questão é quanto aos adiantamentos de cliente e os pagamentos parcelados que, para o reconhecimento de receita de prestação de serviços, estes podem não corresponder, necessariamente, aos serviços executados e, assim, não serem reconhecidos nesse momento.
Pois bem, algumas situações merecem ser explicitadas para o reconhecimento de receitas de prestação de serviços na era do IFRS. Uma delas é quando temos uma prestação de serviços atrelada a uma venda de produto. Nessa situação, devemos identificar o que é receita de prestação de serviço e o que é receita de bens e, caso essa prestação de serviço seja efetuada durante determinado tempo, a receita deve ser diferida e reconhecida durante todo esse período. Para o diferimento do valor deve ser calculado os custos esperados pelo serviço contratado, juntamente com uma margem de lucro razoável desses serviços, para poder ser preciso com confiabilidade o valor a ser reconhecido como receita de prestação de serviço nessa modalidade em que é atrelado a uma venda de bens.
Outra situação importante é quanto as taxas de matricula e a venda de ingresso de eventos. Nessa situação o reconhecimento de receita se dará, respectivamente, quando a aula for ministrada e quando o evento ocorrer.
Posto isso temos que, de forma não exaustiva, porém clara e objetiva, para advogados militantes na área societária e tributária das empresas, administradores e contadores, apresentamos, aqui, os conceitos principais para entendermos sobre o reconhecimento de receita de bens e serviços na era do IFRS.
Fiquem atentos para nossos próximos post acerca do reconhecimento de receita dos contratos de construção, reconhecimento e mensuração de instrumentos financeiros e receita de juros.
Até o próximo post!